TEIXEIRA DE PASCOAES
Luis Manuel Gaspar
Pascoaes e a Sombra.
1996-2011
Pascoaes e a Sombra.
1996-2011
2898 - Teixeira de Pascoaes – O BAILADO. 256 – (1) págs. Lisboa - Porto. Lvmen. 1921 16,8 cm x 11,3 cm. B.
Primeira edição desta obra que Cesariny considerava o “melhor do Pascoaes” e que muito contribuiu não só para despertar o interesse de novas gerações de leitores para o então quase esquecido “poeta do Marão”, mas também para o inserir na genealogia do surrealismo português, o que não deixa de ser curioso uma vez que o Manifesto Surrealista de André Breton foi publicado em 1924…Daí Cesariny ter apelidado este livro como uma obra “surrealista sem o surrealismo” (ver Franco, António Cândido – 30 Anos de Dispersos sobre Teixeira de Pascoaes. Lisboa. INCM. 2014. p.48). Do brilhante prefácio de Alfredo Margarido à edição desta obra publicada em 1987 pela Assírio & Alvim retiramos a parte relativa a uma contextualização histórica da obra, em que é feita referência à “atmosfera francamente necrofílica provocada pela imensa lista dos mortos da 1ª Guerra Mundial” e onde é sublinhada a ligação de certas descrições, interpretações e cenários presentes no livro à “orfandade de uma classe que não consegue inserir-se na história, que dela foi expulsa e agoniza na região de Entre-Douro-e-Minho, em solares apodrecidos, em companhia dos retratos (de antepassados). Se quisessemos proceder a outra leitura, mais perto da história social portuguesa, poderíamos dizer que Pascoaes define, em algumas páginas soberbas, o momento final da agonia das classes que, associando a antiga aristocracia às camadas da burguesia provinda do liberalismo, têm de fazer face às novas exigências da sociedade, mostrando-se incapazes de proceder à reconversão mental e técnica indispensável. (…)”. Mas "O Bailado" é muito mais do que este surrealizante “autorretrato de classe” que nos deixou Pascoaes. Como nos diz António Cândido Franco “partindo da realidade que o envolve, Pascoaes, através da imaginação desenvolve as qualidades sobrenaturais (ou se quisermos, surreais) dessa mesma realidade, estabelecendo uma relação constante de conhecimento entre a consciência e a aquilo que o rodeia. A oportunidade deste modo particular de actuar (contemplando) é de tal ordem que nos é permitido por em causa o estatuto material da realidade como tal, perguntando-nos, como se pergunta o poeta, se realidade não é ela própria do puro domínio das representações espirituais. (…). O Bailado de Teixeira de Pascoaes (…) é a afirmação de uma imaginação criadora que poderíamos ainda designar de poética ou até de mágica, reafirmando assim a ideia de que o mundo das analogias tem um poder não só paralelo e similar, como até determinante. O bailado é a acção ou o movimento que a Memória exerce em direcção ao passado, constituindo-se este movimento imanente em abertura transcendente. O passado perde por isso toda a sua materialidade, afirmando-se como uma méta-matéria que nos aparece então, com todas as suas figuras como a sombra do futuro. A irrealidade do livro é afinal a afirmação material de um mundo estritamente poético que, mais criativo, se torna ainda mais real do que o próprio real.”. (ver Franco, António Cândido – 30 Anos de Dispersos sobre Teixeira de Pascoaes. Lisboa. INCM. 2014, pp.48/49). Exemplar não encadernado. Por abrir. VENDIDO. |
2899 - Teixeira de Pascoaes – DUPLO PASSEIO. Porto. Tipografia Civilização. 1942. 244 págs. 17,5 cm x 11, 5 cm. E.
Primeira edição dum invulgar passeio que tem início na Casa de Pascoaes e atinge o seu ponto alto na pequena aldeia de Travassos (Montalegre). A viagem é fundamentalmente uma jornada espiritual que levou Pascoaes a “várias divagações de carácter religioso”. No centro destas “divagações” está “o caso de Travassos” que o autor conta da seguinte forma: “[Em Travassos] Saimos do auto e fomos contemplar uma escultura de Cristo crucificado, de tão ingénua divindade e tão ingenuamente martirizada que as suas chagas vermelhas pareciam rir-se do artista que as pintou…Estava eu numa atitude de crítico ou de idiota, quando me tocaram no braço esquerdo. E logo uma rapariga, de onze anos talvez, apontou-me o Cruxifixo, dizendo: - Aquele é o Senhor…” (Duplo Passeio. 1942. p. 61). O gesto da menina – e a leitura que Pascoaes faz de todo aquele momento – desassossegou de tal forma o poeta que o levou a um delírio místico (e a um conjunto de variados pensamentos e reflexões sobre diversas matérias) que ocupa grande parte do resto do livro. Pascoaes revela então o “Ateoteísmo” (o ateísmo de Deus), questiona o sentido e a capacidade de interpretação da realidade e da existência afirmando que “o sonho é que nos prende à Origem”, pergunta “Quem deseja viver?” e respondendo de imediato “Talvez os mortos", lembrando ainda a diferença entre gozar a vida e viver: "Gozar a vida é dançar nos braços das cortesãs ou da Tragédia, emborcar taças de Champanhe em louvor de Baco, arder numa fogueira de delícias...Ser fumo é a última palavra do ideal...Mas viver a vida! Quem é que se extasia no terror dos abismos, na vertigem das altitudes ou sobre as patas da Esfinge esmagadora? Viver é interrogar a morte, nada mais...É ser um doido como Lucrécio ou um deslumbrado como S. Paulo!”. Questiona-se novamente “Que é o remorso da saudade?” respondendo “Larvas tentando a mariposa”… “Duplo Passeio” é, provavelmente, uma das obras mais importantes de Teixeira de Pascoaes. António Cândido Franco descreve o livro como [uma] “metamorfose alucinante e selvagem que não tem qualquer paralelo na literatura portuguesa do tempo” (ver Franco, António Cândido – Notas para a compreensão do surrealismo em Portugal. Editora Licorne. 2012. pp. 33-34). Exemplar encadernado. Sólida encadernação com a lombada e cantos em pele. Conserva as capas de brochura (e a lombada inserida no final do volume) Interior em bom estado de conservação. VENDIDO. |
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3000 - Teixeira de Pascoaes – EMBRYÕES. Porto. Typographia Industrial. 1895. 132 – (1) págs. 17 cm x 12 cm. E.
Primeira edição deste que é o primeiro livro de poesias publicado por Teixeira de Pascoaes. As criticas negativas a esta obra (nomeadamente a de Guerra Junqueiro) levaram a que Pascoaes destruísse grande parte dos exemplares de Embryões… Sobre esta obra originalmente publicada em 1895 diz-nos o seguinte António Cândido Franco (ver Prefácio a edição fac-similada de Embryões. Ed. da Câmara Municipal de Amarante. 2015) : “Não se escrevem aos 16 ou 17 anos, idade em que Pascoaes compôs os textos recolhidos em Embriões, versos geniais. Mesmo Arthur Rimbaud, a criança poeta, caso de excepcional precocidade, precisou de aguardar pelo ano em que completava 19 anos, 1873, para fechar as duas obras maiores da sua criação, Une Saison en Enfer e Iluminations, as derradeiras que compôs. Sem elas, a sua poesia seria (quase) incaracterística, não obstante escrever versos em latim desde 1868 e em francês desde o ano seguinte. A desvalorizar esta estreia, dando razão ao juízo inicial do poeta de Pátria, Jacinto do Prado Coelho, talvez o mais profícuo estudioso do poeta, avaliou o livro por medíocre. Observando (no volume inicial das “Obras Completas”, 1965: 63) a primeira criação do poeta, publicada no jornal local de Amarante, falou de composição frouxa, repassada dum pessimismo convencional, que alargou a toda a fase recolhida no livro de 1895. Por esse motivo escusou-se a reproduzi-lo nas "Obras Completas” – de resto como o poeta se escusara nos volumes onde no final da década de 20 do século XX recolheu, revista e reescrita, a sua criação poética anterior e onde não se encontra cheiro do volume. Mário Garcia, outro ilustre estudioso do autor de Duplo Passeio, toca a mesma nota crítica. Nada transparece - diz ele (Teixeira de Pascoaes. Contribuição para o estudo da sua personalidade e para o estudo da sua obra (1976: 81)] - nestes versos de adolescente, do futuro pendor metafisico e do alento grandissonante de algumas poesias de Sempre ou de Terra Proibida. Maria das Graças Moreira de Sá afina por idêntica altura. Afirma ela - O Essencial sobre Teixeira de Pascoaes (1999: 10) – que a estreia (do poeta) no parnaso português não foi brilhante. José Carlos Seabra Pereira, no estudo “Sobre Embriões, primeira obra de Teixeira de Pascoaes”, (O Primeiro de Janeiro, 23-11-1977), o mais completo até hoje sobre esta primeira colheita de versos, alinha da mesma forma a sua voz. Cito: Mais tarde, Pascoaes enjeitaria este primogénito do seu estro. E, com efeito, de construção estrófica e extensão variáveis (...) e numa versificação sempre tradicional mas fruste, as composições do livro só com raras excepções mereciam outra sorte que o repúdio a que foram sujeitas. A certeza de que as primícias de Pascoaes são do ponto de vista poético magras e verdes, sem a opulência que se tira das suas obras posteriores, não pode porém fazer esquecer os pontos fortes que o livro de 1895 tem e que chegam para o colocar acima da mera curiosidade. Nenhum crítico atrás mencionado deixou de assinalar, sem explorar porém o paradoxo, que os segmentos mais representativos da poesia de Pascoaes, como a obsessiva atenção aos lugares, às personagens e à memória da infância, quer dizer, tudo o que tornou depois a sua poesia pessoal e inconfundível, vibram já de forma consciente nesta primeira fase da sua criação, sobretudo nos versos de abertura do livro. Não se lhes nega capacidade expressiva, sensibilidade saudosa, densidade metafisica. Está lá um pensar quase sem conceitos, pensar secreto e imaginativo, que será afinal o pensamento poético que acompanhará Pascoaes até às grandes obras finais. Também noutros passos do livro se reconhecem segmentos, distintos da poética madura do autor, a saber, acerto nas imagens, plasticidade métrica, percepção transfigurante da natureza e permanente insatisfação formal - provada na comparação entre as versões inicialmente publicadas no jornal de Amarante e as depois recolhidas no livro -, que se tornará uma das obsessões maiores da vida poética de Teixeira de Pascoaes, que em cinco edições feitas em vida da colectânea Sempre (1898; 1902; 1915; 1923; 1929) de cada uma delas fez um livro distinto e único e não fazia por menos de três versões cada uma das suas biografias. O facto de Pascoaes ter destruído parte importante da edição do seu livro de estreia, cuja tiragem não deve ter ido além das poucas centenas de exemplares, tornou-o peça rara e hoje muito cobiçada pelos bibliófilos. É sabido que nas curvas e contra-curvas do comércio quanto mais rara é a oferta, mais alto sobe, se a procura cresce um tanto, o valor. Ora Teixeira de Pascoaes, ao longo de sucessivas gerações, manteve e alargou até um círculo de leitores, que desenvolveu crescente curiosidade pelo seu volume de estreia, durante décadas pouco mais do que ignorado. Embriões foi o único dos seus livros nunca reeditado ou reimpresso, pois até Profecia, que viu a luz em Coimbra em 1901, assinado a quatro mãos com Lopes Vieira, foi reproduzido por Faria e Maia n'A Minha Velha Pasta (1937) (…). Resultou daqui uma situação grotesca. O livro mais desvalorizado por Teixeira de Pascoaes, o livro que ele procurou destruir e esquecer, o volume de 1895, é hoje aquele que o mercado mais encareceu. Exemplar encadernado. Encadernação com a lombada em pele. Alguns sinais de desgaste na pasta. Conserva as capas de brochura. Folha de rosto com uma mancha (talvez fruto da remoção de uma assinatura ou marca de posse) no canto superior direito. Restante interior em bom estado geral de conservação, ainda que apresente um ou outro pico de acidez. VENDIDO. |
3001 - Teixeira de Pascoaes – O HOMEM UNIVERSAL. Lisboa. Edições Europa. 199 – (12) págs. 18,3 cm x 11, 5 cm. B.
“Prólogo – Escrevi este volume, com o intuito de elucidar o leitor amigo, acerca do pensamento da minha obra, desde a sua origem (1897) até ao ano de 1937. Escrevi-o como quem conversa, em voz alta, consigo mesmo. (…) E o verdadeiro assunto deste livro é o drama da vida e o seu actor. O drama cria o actor; é o campo electromagnético em que se produz o relâmpago, a atmosfera do seio da qual irrompem asas e cantos. E o dramaturgo? Tal questão interessa à Teologia. Mas o drama da vida, através da sua aparência social é profundamente religioso. O destino do homem é ser a consciência do Universo em ascensão perpétua para Deus”. Primeira edição. Capa de Martins Barata. Exemplar encadernado. Encadernação com a lombada em pele. Conserva as capas de brochura. Interior em bom estado geral de conservação. VENDIDO. |
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3002 - Teixeira de Pascoaes – LONDRES. Lisboa. D. Manuel de Castro e Guilherme de Faria Editores. 1925. 17 págs. 18 cm. x 12 cm. B.
A história de “Londres” é bem conhecida dos leitores de Teixeira de Pascoaes. Provavelmente em Outubro de 1908, estando no Porto, Pascoaes conheceu uma senhora inglesa, Leonor Dogge (ou Dagge), por quem se apaixonou perdidamente. Manteve algum convívio com Leonor e com a família desta ao longo de 1909. Nessa altura fica convencido que o seu amor é correspondido mas entretanto Leonor abandona o Porto e regressa a Londres. Inconformado Pascoaes persegue-a e embarca para a capital inglesa em Novembro de 1909. Regressou a Portugal em Janeiro de 1910 triste e desiludido. O seu amor não havia sido correspondido... Este período coincide com uma mudança na sua vida pois é nesse período que decide abandonar a advocacia e dedicar-se exclusivamente à escrita (ver Ferreira, António Mega – Fotobiografia de Teixeira de Pascoaes. Lisboa. Assirio & Alvim. 2003 p. 46 e seguintes; obra descrita neste catálogo no nº 3007). O resultado de tudo isto foi o livro “Londres” “cidade que o nevoeiro embriaga e espectraliza” por onde o poeta deambulou (“E via-me perdido e anónimo estrangeiro/Naquela multidão fantástica de gente,/A que só me prendia acaso, vagamente/Idêntica impressão de frio e nevoeiro…”. No programa Grandes Escritores (RTP) uma irmã de Teixeira de Pascoaes, D. Maria da Glória Teixeira de Vasconcelos, refere a paixão por “Leonor” como uma das grandes paixões da vida de Pascoaes: “Teve grandes paixões. Teve duas violentíssimas! Uma, por uma inglesa…até foi atrás dela para Inglaterra quando nunca tinha saído aqui de Portugal…É verdade, uma paixão doida! Outra por uma senhora (…) muito bonita, Fernanda Van Zeller. Essas foram as grandes, grandes! Depois [outras]…não tinham importância, passavam-lhe num instante…Mas essas não. Duraram imenso ele não era para meias medidas!”. Não deixa de ser curioso acrescentar que em 1918, precisamente 8 anos após a frustração amorosa com Leonor, Pascoaes candidata-se (sem sucesso) a uma cátedra de Língua e Literatura Portuguesa no King’s College em Londres…Uma simples coincidência? Ou o fruto de paixões que “duraram imenso” e que marcaram um homem que “não era para meias medidas”? Exemplar valorizado por uma dedicatória de Teixeira de Pascoaes ao médico e escritor Dr. Augusto d’Esaguy. O livro é uma oferta e “lembrança” de Pascoaes ao seu “querido amigo”. Exemplar não encadernado. Interior em bom estado de conservação. VENDIDO. |
3003 - Teixeira de Pascoaes – O POBRE TOLO. Porto. Renascença Portuguesa. 1924. 207 -1 págs. 19 cm x 12, 1 cm. B.
Primeira edição desta que é muito provavelmente a obra mais original de Teixeira de Pascoaes. Como é sabido “O Pobre Tolo” foi também publicado em verso (com diversas alterações em relação à sua forma original) e, de acordo com António Cândido Franco, está intimamente ligado ao “Livro de Memórias”, sendo as três obras aqui referidas “livros encadeados” (ver Franco, António Cândido – 30 Anos de Dispersos sobre Teixeira de Pascoaes. Lisboa. INCM. 2014. p.145 e seguintes). Este livro, impossível de resumir, é em certa medida uma viagem por vários tempos e dimensões (no sentido mais abrangente da palavra) e tem por cenário a ponte de S. Gonçalo de Amarante. Uma explicação para esta obra leva-nos ao encontro do prefácio à edição publicada em 2000 pela Assírio & Alvim onde podemos ler as seguintes palavras escritas por José Tolentino Mendonça: “Talvez a maior grandeza desta obra esteja na soberana solidão com que nos olha. Indiferente às convenções, escandalosamente distante daquilo que no seu tempo (e no nosso) era a civilização e a literatura. O Pobre Tolo é uma figura de fronteira na paisagem mental do século português. Uma figura seminal, nocturna, uma negríssima substância insone (…) uma conversa de mortos, arbitrária, irónica, fragmentária. Raras vezes se viu texto assim na nossa tradição literária. (…) Não sei colocar num escalão este livro (…) para que servirá uma obra que obstinadamente (obscenamente apetecia escrever) faz da literatura uma questão de vida ou de morte? [O Pobre Tolo] trata-se de um drama sonhado (…). A suspensão que demora o eu naquela ponte introduz uma descontinuidade no fluir tranquilo da história. O que nos propõe então Pascoaes? Poderíamos talvez sublinhar duas teses. Primeiro aquilo que na obra se apelida por processo mitológico. O autor avisa-nos, logo, da radicalidade deste propósito, dizendo tratar-se de «um processo conhecido apenas dos malucos». No fundo, é dar-se conta, sem as reservas que nos defendem do desabalado segredo da existência que torna indefinido e inesgotável o espaço e o tempo (…). É encetar um processo novo de consciência de si e do mundo: por muitas camadas civilizacionais que nos ocultem a nossos próprios olhos que «somos uma fogueira mitológica», somos um rasto, uma mancha ou, na fantástica definição do escritor, somos «uma nódoa azul». A segunda tese (…) é a da redescoberta da «infância orginal».” Tolentino Mendonça situa esta obra na “figura do Tolo ou do Idiota, que Pascoaes coloca na ponte de S. Gonçalo de Amarante [e] que tem uma longa história no domínio da literatura espiritual. (…). Ao longo dos séculos o tema do idiota conhecerá anotações diversas (…) desde a simples captação de benevolência (…) à laicização moderna do tema concretizada no Cândido de Voltaire ou em O Idiota de Dostoiévski (…)". E concluí o seu prefácio dizendo que este “texto sonâmbulo, uma espécie de meditação sobre que palavra poderia ser dita depois do fim das palavras, é ainda um «quase ver». Mas como atesta Pascoaes «o quase é o bastante para inundar de trevas a paisagem». Que trevas tão luminosas, quero dizer”. A esta introdução de Tolentino Mendonça pouco se pode acrescentar. Impressionaram-no o “malucar sozinho com as cousas”, os “mortos que sonham”, os “entendimentos secretos”, as “vozes misteriosas que nos entristecem para sempre”…Como certamente impressionará a qualquer leitor, a visão da Loucura “como um deusa crucificada nos homens de juízo”, “os desejos fantásticos dos mortos”, os “gritos de luz afogados no mar infinito do Silêncio”, a realidade comovida (“a realidade comove-se”), o “riso do silêncio mais poderoso do que o riso da loucura”, a salvação pelo esquecimento (“o esquecimento é que nos salva”), a imortalidade pela lembrança num non omnis moriar popular inserido numa obra cheia de referências eruditas (“a lembrança dos vivos é o pão dos mortos”), o Silêncio sempre presente em toda a obra (“silêncio que ninguém ouve, a não ser os mochos e os malucos”), a realidade que nos esmaga (“ a Realidade é uma arquitectura cruel à força revelada e saliente. Esmaga-nos: é um peso material, porque o ideal é um pesadelo”), ou ficarmos a saber que “somos um sonho divino que não se condensou por completo dentro dos nossos limites materiais”… No que diz respeito à tradição literária em que se insere a personagem e o cenário desta obra, talvez não seja absurdo relembrar algumas relações interessantes ou certos paralelismos que se podem traçar. Se sobre o Idiota – e a sua já referida história no domínio da literatura – e sobre o meio de qualquer Ponte como “hesitação materializada” se subscreve tudo que foi referido por Tolentino Mendonça, poderá não ser de todo desinteressante remeter “a Ponte” e a escolha a fazer (neste caso pelo Tolo) sobre que direcção seguir para a Encruzilhada enquanto tema e dilema com um significado simbólico parecido (embora não totalmente idêntico) e presente em diversas tradições populares e obras literárias, onde, por regra, uma decisão sobre a escolha de um caminho acaba por ser tomada (veja-se D. Quixote de la Mancha, em que a Encruzilhada é abordada já como um tema clássico das novelas de cavalaria no capítulo em que D. Quixote, imitando os cavaleiros doutrora, ao deter-se numa encruzilhada pára, fingindo pensar na direcção a tomar, decisão essa que acaba por ser tomada por Rocinante que opta por um regresso à cavalariça, o que nos remete para o absurdo que em parte caracteriza a obra…). Quanto às possibilidades deixadas em aberto para o final aparentemente “satírico” desta obra também fará algum sentido referir ou sublinhar que em “O Pobre Tolo” de Pascoaes não há uma decisão quanto ao caminho a seguir. Há, no final, uma simplificação que nos remete para uma rara certeza: “somos enviados, mas ignoramos a nossa missão e procedência”. E, em função disso, parece haver a opção de acreditar em vez de escolher, ou da escolha de uma não escolha pois o tolo “caiu das nuvens” e “não se decide a tomar um rumo qualquer” (…) “não se decide e ignora tudo (…) apenas acredita (…) que há-de voltar para as nuvens (…)”. É assim que termina a viagem d’O Pobre Tolo. Ilustração da capa da autoria de Carlos Carneiro. Exemplar não encadernado. Capas de brochura com alguns defeitos (ver imagem). Assinatura de posse (de Manuel Martins) na folha de rosto (ver imagem). Interior com alguma acidez mas em bom estado geral de conservação. VENDIDO. |
3004 - Teixeira de Pascoaes – SÃO PAULO. Porto. Livraria Tavares Martins. 1934. 427 págs. 19 cm. B.
Primeira edição da primeira das célebres biografias de Teixeira de Pascoaes. São Paulo marca uma nova fase na vida do escritor e confere-lhe um certo sucesso internacional (ver nº 3005). Em São Paulo Pascoaes encontra um par para Lucrécio: “O De Natura Rerum é um poema actual, e o mais moderno. Mas depois do Poeta descrente, veio o Apóstolo de Cristo. Não será uma esperança? A esperança é deusa cristã, irmã da Graça, outra deusa de Jesus. A esperança responderá ainda ao grito do nosso desespero? E a graça aos gemidos da desgraça?”. É o próprio poeta que em diversas obras irmana Paulo e Lucrécio – os poetas que mais amava - quando os apresenta como aqueles que sabem responder ao mistério da Vida : “Viver é interrogar a morte, nada mais...É ser um doido como Lucrécio ou um deslumbrado como S. Paulo!” (ver Duplo Passeio). E é em parte desse contexto, dessas duas formas unívocas do entendimento da Vida, que nasce “São Paulo”. Exemplar não encadernado. Com uma cartolina onde se pode ler “Uma nova luz sobre S. Paulo e o seu tempo” colada na folha de anterrosto. Interior em bom estado geral de conservação. VENDIDO. |
3005 - Teixeira de Pascoaes (A. V. Thelen e H. Marsman; trad. e edição) – PAULUS DE DICHTER GODS. Amsterdam. J. M. Meulenhoff. 1949. 298 – (2) págs. 22, 2cm x 14, 5 cm. E.
É esta uma das várias reedições holandesas de "São Paulo", publicada numa altura em que Albert Vigoleis Thelen, tradutor da obra, procurava promover Pascoaes “no espaço de língua alemã” tendo “na calha traduções ou planos de edições de Napoleão, de Duplo Passeio, de O Bailado e do epistolário com Unamuno” e fazendo com que nomes com os de “Berdiaev, Einstein e Thomas Mann se interessassem pela literatura de Pascoaes” (ver Franco, António Cândido – 30 Anos de Dispersos sobre Teixeira de Pascoaes. Lisboa. INCM. 2014. p. 205 a 208). É interessantíssima a história de Albert Vigoleis Thelen e a sua relação com Teixeira de Pascoaes. No contexto da II Guerra Mundial Thelen veio refugiar-se na Casa de Pascoaes onde viveu com a sua mulher Beatrice entre 1939 e 1947. Thelen foi um incansável divulgador da obra de Pascoaes e conseguiu que "São Paulo" tivesse mais sucesso na Holanda e na Alemanha do que em Portugal, onde o livro foi recebido com desconfiança e frieza… Exemplar encadernado. Encadernação em tecido. Título gravado a dourado. Sem capas de brochura. Interior em bom estado geral de conservação. VENDIDO. |
3006 - Teixeira de Pascoaes – VERBO ESCURO. Porto. Renascença Portuguesa. 1914. 171 – (4) págs. 15, 8 cm x 12 cm. E.
Primeira edição deste livro que, de acordo com Mário Garcia na introdução à edição de 1999 da Assírio & Alvim, marca um ponto de viragem na obra de Teixeira de Pascoaes pois “estão de facto contidos no núcleo do Verbo Escuro, os grandes temas das obras posteriores”. Diz-nos Mário Garcia que é “no fogo mais aceso da direcção da Revista A Águia, no fervor da edição dos seus escritos saudosistas e das polémicas com António Sérgio” que Pascoaes “publica o Verbo Escuro, para mostrar «que o sol é o esplendor da Vulgaridade» e que o homem «é o ser perdido no tenebroso centro do Universo, chorando a esplendorosa Superfície onde gravintam os mundos bem-aventurados, com uma face voltada para a noite, para esse trágico Abismo abrasado de estrelas, rumoroso de Almas aflitas não seu cárcere eterno – e com a outra face voltada para as divinas Altitudes»”. “Nunca, em Pascoaes, a palavra foi tão expressiva como no Verbo Escuro”, sendo portanto esta obra um marco incontornável da bibliografia de Teixeira de Pascoaes. Exemplar encadernado. Sólida encadernação cartonada e em sintética. Conserva as capas de brochura. Com uma dedicatória assinada por “Maria Margarida” a ocupar grande parte da folha de guarda. Restante interior em bom estado geral de conservação. VENDIDO. |
3007 - Ferreira, António Mega – FOTOBIOGRAFIA DE TEIXEIRA DE PASCOAES. Lisboa. Assirio & Alvim. 2003. 177 págs. 29 cm. B.
Interessantíssima fotobiografia de Teixeira de Pascoaes, repleta de informações sobre o poeta e de ilustrações onde podemos encontrar os desenhos de Pascoaes, fotografias suas, da sua família e dos seus amigos, dos locais onde viveu, onde estudou, por onde passou, etc. Exemplar encadernado. Encadernação editorial. Interior em bom estado de conservação. VENDIDO. |
3008 - Franco, António Cândido; Sinde Pedro (textos) – TEIXEIRA DE PASCOAES. ESPÓLIO MANUSCRITO NA BPMP. Porto. Biblioteca Pública e Municipal do Porto. 2002. 85 págs. 23 cm. B.
Descrição das espécies manuscritas de Teixeira de Pascoaes existentes na Biblioteca Pública e Municipal do Porto. O catálogo propriamente dito é precedido de dois valiosos textos: “Para uma cronologia quase só portuguesa de Teixeira de Pascoaes” de António Cândido Franco e “Pascoaes num relâmpago” de Pedro Sinde. Ilustrado. Exemplar não encadernado. Interior em bom estado de conservação. VENDIDO. |
3009 - NO CENTENÁRIO DO NASCIMENTO DE TEIXEIRA DE PASCOAES. Lisboa. Imprensa Nacional – Casa da Moeda. 1980. 238 págs. 28 cm. B.
Edição comemorativa do centenário do nascimento de Teixeira de Pascoaes. Esta obra conta com a colaboração de Agustina Bessa-Luís, Albert Vigolais Thelen, António Areal, António Quadros, António de Sousa Machado, Cesariny, Domingos Monteiro, Dórdio Guimarães, Eduardo de Oliveira, Emília Nadal, Eugénio de Andrade, Ilídio Sardoeira, J. Rodrigues, João de Araújo Correia, João Gaspar Simões, João Maia, Joaquim de Carvalho, Joaquim Montezuma de Carvalho, Joaquim Paço d’Arcos, Jorge Guimarães, Jorge de Sena, José Gomes Ferreira, José Martins Garcia, Liberto Cruz, Lúcio Craveiro da Silva, Maria do Carvalhal, Maria Eulália Macedo, Maria José de Vasconcelos Mota, Miguel Torga, Natália Correia, Natércia Freire, Rafael Gomes Filipe, Sophia de Mello Breyner Andresen, Tomaz Ribas e Victor Belém. Ilustrado. Exemplar não encadernado. Sobrecapa com pequenos defeitos (ver imagem). Interior em bom estado geral de conservação. VENDIDO. |
3010 - Vasconcellos, Maria da Glória Teixeira de – ÚLTIMO LIVRO. Braga. 1976. 62 págs. 20 cm. B.
Última obra publicada por Maria da Glória Teixeira de Vasoncellos irmã de Teixeira de Pascoaes. Com interesse para a vida e obra de Teixeira de Pascoaes destacam-se os seguintes capítulos: “Dar”, “A Casa de Pascoaes”, “A estrada de São João de Gatão” e “Quando Pascoaes Morreu”. Exemplar com uma dedicatória assinada pela autora (só a assinatura é da autora da obra, a caligrafia da dedicatória é diferente). Exemplar não encadernado. Interior em bom estado de conservação. VENDIDO. |
Bibliografia (parcial) consultada para a elaboração deste catálogo:
Ferreira, António Mega – Fotobiografia de Teixeira de Pascoaes. Lisboa. Assirio & Alvim. 2003
Franco, António Cândido – 30 Anos de Dispersos sobre Teixeira de Pascoaes. Lisboa. INCM. 2014
Franco, António Cândido – Notas para a compreensão do surrealismo em Portugal. Editora Licorne. 2012
Margarido, Alfredo – Teixeira de Pascoaes a Obra e o Homem. Lisboa. Arcádia. 1961.
Pinharanda Gomes – A Filosofia Hebraico Portuguesa. Porto. Lello & Irmão. 1980.
Ferreira, António Mega – Fotobiografia de Teixeira de Pascoaes. Lisboa. Assirio & Alvim. 2003
Franco, António Cândido – 30 Anos de Dispersos sobre Teixeira de Pascoaes. Lisboa. INCM. 2014
Franco, António Cândido – Notas para a compreensão do surrealismo em Portugal. Editora Licorne. 2012
Margarido, Alfredo – Teixeira de Pascoaes a Obra e o Homem. Lisboa. Arcádia. 1961.
Pinharanda Gomes – A Filosofia Hebraico Portuguesa. Porto. Lello & Irmão. 1980.
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